SANTANA DO CARIRI, COMO FOI A "GUERRA DOS CORONÉIS!, TERROR E CARNIFICINA NO CARIRI
Hoje é calma e orgulho, mas já foram batalhas de morte. Homens no
tempo dos mosquetões em punho e pólvora socada no cano da arma. Fardões
contra o gibão. Rastro de sangue, crueldade, dor e medo. População
saqueada e afugentada pelas investidas dos bandos de cangaceiros a
cavalo com suas espingardas e facões, gritando para matar ou morrer. Do
outro lado, entrincheiradas, tropas de capangas firmando rifles, facas,
punhais e o que pudessem usar para proteger seus patrões e a cidade.
Dentro de uma motivação particular de somente dois senhores. Pavor em
dias de "fogo" (era como chamavam os ataques) que datam apenas de 1920.
Agora
tudo é apenas gente pacata, lugar sombreado, silencioso, paz e beleza
ao sopé ocidental da Chapada do Araripe. A espada contra a bala da
chamada Guerra dos Coronéis é um conto muito recente da história de
Santana do Cariri. Os livros e a oralidade ainda começam a recontar essa
passagem. Foram quase dez anos de luta armada. A disputa do senhorio
local para ter a posse da Intendência do município - ainda nem havia
prefeitura.
Mesmo a guerra pode ser contada como um grande
momento da história de uma gente. De um tempo seguinte que ajudou a
desenvolver o lugar e o sentimento de pertença. Diz-se que o major
Manoel Alexandre Gomes, que mandava feito coronel, queria a todo custo
ser intendente de Santana. Tinha como aliado de batalhas um irmão do
temido Lampião. Valia tudo para destituir do cargo o coronel Felinto da
Cruz Neves, que morava na Casa Grande, no centro da cidade, e era homem
respeitado.
Parecia não ser só ambição e poder político o
interesse pela coisa. Falam que tudo começou por pequenas rixas,
desentendimentos entre o pessoal do major Manoel, que morava no sítio
Ipiranga, e gente de Santana protegida do coronel Felinto. E contam
também de uma mesquinhez. A peleja teria sido lançada ainda mais cedo,
em 1911. Quando o governador do Ceará visitou o casarão
recém-inaugurado, que saíra dali fascinado de um banquete, regado a
vinho português e carne de faisão no prato principal. A notícia de que
ninguém da região daria tamanha acolhida se espalhou e teria gerado ódio
e ciúme nas fuças do major. Foi a gota.
Depois disso, morreram
muitos. O historiador Raimundo Sandro Cidrão, morador de Santana, relata
que até o último fogo, em janeiro de 1927, esquartejavam, degolavam,
acuavam. Grávidas davam à luz no terror, o "couro das costas" era
arrancado, o crânio partido a marreta, carne humana dada aos cães, valas
comuns para os adversários ou mesmo para os amigos mortos não mais
reconhecidos depois da carnificina. Até imagens sacras eram crivadas de
balas.
Manoel nunca assumiu o poder de Santana. Porém, quando
tudo já parecia acalmado da guerra dos dois, mandou matar Felinto
traiçoeiramente. Na tarde de 29 de março de 1936, dia de eleições
municipais, quando o coronel tentaria sua sexta indicação ao comando da
cidade. O mandante do crime saiu fugido, desistiu da matança e foi morar
em Juazeiro do Norte, onde morreu anos depois de morte natural. Mas lá
imperava "a lei do mais forte", o poder na marra. E tudo isso foi só há
algumas décadas.
Ao passar por Santana do Cariri hoje, não dá
para imaginar a cidade sob aquela brutalidade. O casarão neoclássico do
coronel Felinto Cruz é o principal símbolo daquele tempo, preservado e
transformado num museu que agora descreve parte desse passado. Santana
nem era povoada até meados do século XVIII. Era terra de andança dos
buxixés, índios nômades que se abancavam perto do rio Cariús. Já foi
Santana do Brejo Grande, Santana do Araripe, Santana do Cariry (antes
com y no final), Santanópole e voltou ao nome Santana do Cariri.
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legal
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