CEARÁ; GEOGRAFIA DO FOLCLORE

CEARÁ O Ceará possuiu elementos brancos de forte atuação colonizadora. A conquista do território foi uma sucessão de guerrilhas. A capital ainda recorda, com o nome sonoro e bélico, o aparato militar que firmava a posse, cidade da Fortaleza! No litoral, praias imensas e brancas, com recursos limitados para a fixação demográfica, viviam os Tupis, vindos do sul, fazendo recuar para o interior os Cariris. Esses, retraídos, refratários ao contato da violência lusitana, aliada ao inimigo racial, foram desaparecendo, em guerras ininterruptas, exaustão, diluídos na raça povoadora. Raras reminiscências sobrenadaram nos mitos conhecidos. Restou-lhes a honra do sinal antropológico que é um signo de tenacidade e de nomadismo, a platicefalia. Os Cariris, evaporados no cadinho bárbaro onde a raça se formou, não foram estudados como o tinham sido Tupis litorâneos. Nem a catequese se fez como nos tempos evangélicos de Nóbrega e Anchieta. Ao padre acompanhava o sesmeiro, capitão-mor da ribeira, com sua escolta de bacamartes e sua tropa de flecheiros. A guerra ao índio era um estado normal, a suprema razão para a petição da terra. Acusavam o selvagem de destruir o gado. Plantava-se a “fazenda de criar” como uma cidadela, com seu mundo de agregados, vaqueiros, índios mansos, negros fiéis. Esse centro era autônomo, independente, autárquico. Daí a persistência dos mitos, a continuidade das histórias velhas, a fidelidade aos costumes de duzentos anos. As rodovias, articulando o sertão a toda a parte, dissiparam o ar respirado há dois séculos. Ceará foi povoado lenta e continuamente. Seus caminhos foram os do sul. Do Rio Grande do Norte, pelos rios Jaguaribe e Acaraú, assim como Pernambuco pela chapada do Araripe; gente de Sergipe e da Bahia, veio também para a ribeira do Salgado e vale do Cariri, subindo pelas margens do Jaguaribe e do riacho dos Porcos, que corre entre as serras do Icó e do Araripe, e pelas cabeceiras do rio do Peixe, na Paraíba (Cruz Filho — História do Ceará, p. 74). O clima folclórico é o mesmo do nordeste. São os mitos idênticos, diferenciações, variantes, adaptações, inteiramente semelhantes. A população do interior, quase imóvel durante longo tempo, manteve a maioria dos mitos talqualmente os recebera. Como a influência negra não é preponderante, mas apenas sensível e também mais aproximada do oceano, encontramos os mitos de origem europeia e os indígenas, diversificados pela mestiçagem, quase em estado de pureza. Não será possível dizer-se que esse material permaneça como há vinte anos. O sertão respira pelas mil bocas das estradas e paga o conforto da eletricidade com o esquecimento das estórias antigas e saborosas. Os mitos gerais são sempre lembrados. Os indígenas vêm segundamente. Os negros podem ter dado elementos para a construção. Nenhum mito lhes autentica influência decisiva. Extraído de Geografia dos Mitos Brasileiros, de Luiz da Câmara Cascudo

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