PADIM CAZUZINHA
Tanto faz José como Cazuza. Seguindo o ditado popular, o filho mais novo de Dona Flor recebeu desde garoto a alcunha de Cazuzinha. Para ela continuava sendo o José e nunca a ouvi chamá-lo pelo apelido, somente os seus irmãos o faziam.
Ainda muito jovem começou a trabalhar com o meu pai e cresceu entre nós, como se fosse um dos filhos de Sêo Geraldo, ajudando-o nos afazeres da bodega e na lida com os negócios de compra de algodão. Minhas lembranças o encontram já recém-casado com uma filha de Seô Simplício, lá do Barreiro do Jorge, um doce de pessoa até os dias de hoje. Tal era o apreço de meu pai por ele que o tomou para ser meu padrinho crisma. Isso era importante naqueles idos.
Rapaz esforçado, logo montou o seu próprio negócio comprando a sapataria do Valdemar que estava de mudança para o Crato. Se estabeleceu num ponto comercial vizinho à pensão de dona Chiquinha e começou a fabricar sapatos, sandálias e outros artigos de couro, tornando-se um dos comerciantes do lugar. Toda semana ia ao Crato, nos dias de feira, para comprar novos modelos de sandália, chinelas japonesas e todo tipo de matéria-prima para os seus próprios produtos. Nunca esquecia de me trazer um presente.
Padim, como eu o chamava, sempre estava de bom humor e gostava de brincar com todos. Adorava dar umas voltas de bicicleta e me deixava muito feliz quando me punha na garupa da magrela, subia e descia pela rua principal como se estivesse desfilando num carro do último tipo. Era o meu ídolo a quem sempre fui muito apegado e a quem respeitava como se meu pai fosse.
Quando estava fazendo arte, aprontando das minhas lá pela bodega, me mandava para casa e eu muitas vezes batia o pé para não ir. Ele insistia, insistia e quando não dava resultado usava sua técnica infalível e dizia|: “Pois fique aí. Não é mais para ir.” Eu, só para desobedecer, ia rapidinho para casa como ele queria. Todas as vezes que minha mãe cozinhava uma galinha, separava os pedaços favoritos do compadre Cazuzinha e lá eu ia com uma pequena caçarola de ágata, levar-lhe a iguaria.
Quando Sêo Geraldo recebeu um amplificador, um alto falante e uma montanha de discos como pagamento de um cinema mambembe que por ali passara, tornou-se o responsável para colocá-lo em funcionamento, alegrando as noites do lugar com música e prestação de serviços. Quando me machucava nas minhas peraltices era sempre ele o primeiro a chegar, prestar socorro, puxar a orelha e me consolar do choro interminável. Dizia sempre: “Quando casar, sara rapaz!”
Ficaria aqui a escrever páginas sobre o meu padrinho, ele que também foi um menino da beira do rio Cariús.
Dongguan, 09/03/2017
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